Crise de ambição da COP30: quem quer pagar a conta?

Crise de ambição da COP30: quem quer pagar a conta?

19.11.2025

Por Leo Braga, professor do Curso de Relações Internacionais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio

As expectativas com a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, eram, e ainda são, as mais elevadas possíveis. Afinal, localizada bem na Amazônia, Belém simboliza aquilo que os países em desenvolvimento representam (desigualdades e privações) e demandam (recursos financeiros e planos de ação).

Ao término da primeira semana de intensas negociações técnicas, até que se chegue às definições ministeriais, um panorama mais complexo emergiu. A super ambiciosa agenda da COP30 ganha respaldo em importantes declarações, novas promessas e alguns planos de ação, mas padece do mesmo mal de sempre: a boa vontade dos países para levar a cabo suas promessas.

Ponto importante de boa-fé, aqui da COP30, foi a Declaração de Belém para a Industrialização Verde, voltada à coordenação dos esforços para avançar em energias renováveis, diminuição de poluentes e utilização sustentável de recursos naturais, como água, por exemplo, de modo justo e sustentável para todos os países, mas de modo acelerado para os países em desenvolvimento, o que envolve transferência de recursos financeiros e tecnologia.

É necessário pensar em transição como, aliás, tem sido dito no jargão da transição energética justa. Bem, aí podemos até mesmo ver a luz no fim do túnel: é possível fazer transição energética justa se começarmos a pensar em termos práticos sobre produção industrial e postos de trabalho, com financiamento (não reembolsável em menor grau, provavelmente) e qualificação de mão-de-obra.

Com certeza, outro ponto alto de Belém, até agora, é o “Belém 4x”: plano de ação para quadruplicar até 2035 o uso de combustíveis sustentáveis. Curiosamente, no entanto, dos 23 países que aderiram ao plano de ação, apenas quatro são considerados tradicionalmente países desenvolvidos (Canadá, Itália, Japão e Países Baixos). Mas, ok, vamos avançando.

Mas, sem dúvida, o resultado mais louvável e tangível da primeira semana foi a formalização do "Roteiro Baku a Belém", iniciativa que estabelece a nova meta anual de financiamento climático – formalmente conhecida como Nova Meta Coletiva Quantificada (NCQG) – em impressionantes US$ 1,3 trilhão. Esse é o novo preço a se pagar pela sobrevivência do planeta. Se o valor é tão alto assim é porque o problema é mesmo grave.

Bem, desde o Protocolo de Quioto e, mais recentemente, com o Acordo de Paris, o princípio da responsabilidade comum, mas diferenciada sempre exigiu moralmente maior participação dos países desenvolvidos na questão ambiental. Está lá no Artigo 9.1 do Acordo de Paris, que os países desenvolvidos devem financiar aqueles em desenvolvimento. Mas, se a cifra pensada na ordem de US$ 100 bilhões por ano não foi plenamente alcançada, o que se pensar agora?

Os países do que chamamos hoje do Sul Global exigem que esse financiamento seja tratado como uma forma de "reparação histórica" ??pelas injustiças climáticas, disponibilizada por meio de fundos públicos acessíveis e não reembolsáveis, e não simplesmente por meio de empréstimos baseados no mercado. Aí, temos uma dificuldade: “não-reembolsáveis”.

Pode ser relativamente fácil que os países ricos entendam sua parcela de contribuição mais significativa para a questão ambiental, mas assim o fazer a custo perdido é outra coisa. Esse conflito entre uma nova meta impressionante e a obrigação não resolvida de cumpri-la tornou-se a principal tensão da cúpula e é exatamente isso que vem arrastando a questão ambiental para o buraco, desde sempre. Os debates avançam mais rapidamente que a boa vontade.

Aqui, da parte dos países em desenvolvimento, o Brasil, como anfitrião, tem feito um esforço diplomático significativo para criar um "Roteiro" que oriente o mundo na transição para longe dos combustíveis fósseis, em que pese nossa disposição de manter exploração desses combustíveis, como o acalorado debate acerca da exploração do petróleo na margem equatorial.

Aí, vamos nos valer daquela máxima popular: "pau que dá em Chico, dá em Francisco". Porque, no final das contas, é sobre isso os insistentes impasses e o contínuo pouco-caso dos países ricos em relação aos países pobres. A posição brasileira favorece a compreensão do comportamento dos países ricos via mais uma máxima popular: “devagar com o andor que o santo é de barro”. Nisso tudo, a crítica direcionada aos países ricos cabe a nós mesmos e aí, “alto lá!”

Quem quer desacelerar sua economia e colocar em risco produção de bens e serviços, postos de trabalho e produção de renda e riqueza, desde já – ainda mais num mundo do século XXI que tem experimentado um processo de desglobalização em que os países só olham cada vez mais para seu próprio umbigo? Nem países
desenvolvidos, nem em desenvolvimento.

Com as bases técnicas já estabelecidas, a questão fundamental para os líderes mundiais, ao entrarem na semana final, não é mais técnica, mas moral: conseguirão eles superar o abismo entre as promessas e a realidade antes que seja tarde demais?